Jornal do Peninha

Opinião e informação

Goiás terá chuvas acima da média em 2025, mesmo sem La Niña ou El Niño

Cenário preocupa setor agrícola 

Samuel Straioto

O ano de 2025 promete um cenário climático singular, marcado pela ausência dos fenômenos La Niña e l Niño, que tradicionalmente influenciam os padrões de chuvas no Brasil. De acordo com André Amorim, gerente do Centro de Informações Meteorológicas e Hidrológicas de Goiás (Cimehgo), o país estará sob neutralidade climática, caracterizada por águas do Oceano Pacífico Equatorial nem frias nem quentes. Contudo, o Brasil Central deve registrar chuvas acima da média devido ao aquecimento do Oceano Atlântico e a outras condições locais.

“A neutralidade não significa normalidade. Em 2025, veremos uma intensidade de chuvas que desafiará tanto as cidades quanto o campo. A regularidade será menor, com grandes volumes concentrados em períodos curtos, o que pode gerar impactos significativos”, alertou Amorim.
O cenário de precipitações intensas traz preocupações para o setor agrícola, que já sofreu perdas significativas nos últimos anos devido à irregularidade climática. Além disso, cidades de Goiás e de outras áreas do Brasil Central precisam se preparar para lidar com possíveis inundações, enchentes e deslizamentos, minimizando os prejuízos.


O período chuvoso, que se intensifica entre dezembro e março, deve trazer condições favoráveis para a recarga de reservatórios hidrelétricos e mananciais. Contudo, a irregularidade na distribuição das chuvas pode dificultar o aproveitamento pleno desse recurso.

Neutralidade climática e seus efeitos no Brasil Central
A ausência de La Niña ou El Niño cria um cenário de neutralidade que, embora não seja raro, exige atenção especial. Segundo especialistas, a neutralidade é caracterizada por variações menores nas temperaturas do Oceano Pacífico, mas isso não significa estabilidade no clima.

“Neutralidade não é sinônimo de equilíbrio. Na verdade, ela pode ser até mais desafiadora, porque as condições climáticas dependem muito mais de fatores regionais, como o comportamento do Oceano Atlântico. O aquecimento do Atlântico neste momento favorece chuvas acima da média, mas também pode amplificar os extremos climáticos”, destacou o meteorologista Pedro Monteiro, especialista em climatologia do Brasil Central.

Esse comportamento climático está diretamente relacionado ao aumento da frequência de eventos extremos, como chuvas intensas em áreas urbanas e períodos de seca em regiões produtivas. Para Goiás, isso significa maior atenção ao planejamento urbano e ao manejo de recursos hídricos.

“Estamos falando de cidades que já enfrentam dificuldades para lidar com o escoamento da água da chuva. Agora imagine essas chuvas chegando com volumes muito maiores do que o habitual. Os impactos podem ser devastadores para a infraestrutura urbana e para a população”, alertou Monteiro.

Chuvas acima da média desafiam setor produtivo
O setor agrícola de Goiás já começou a adaptar suas estratégias diante do cenário climático desafiador. Segundo André Amorim, as perdas significativas registradas em anos anteriores, associadas à seca e ao plantio precoce, ensinaram lições importantes aos produtores.

“Este ano, reforçamos aos agricultores que evitassem o plantio no início de outubro, esperando que as chuvas se estabelecessem. A estratégia foi bem-sucedida, porque o solo conseguiu reter mais umidade antes do plantio, o que favoreceu o desenvolvimento das lavouras”, explicou Amorim.

Embora as perspectivas de chuvas acima da média sejam positivas para a produtividade agrícola, a irregularidade na distribuição preocupa.

“Temos áreas que podem receber volumes muito altos em poucos dias, enquanto outras ficam com menos chuvas do que o necessário. Essa irregularidade representa um grande desafio para o setor, que precisa estar preparado para perdas pontuais”, afirmou o agrônomo João Vilela, especialista em gestão agrícola.

Além disso, o aumento das chuvas também pode trazer problemas como o encharcamento do solo, dificultando o manejo das lavouras e aumentando o risco de erosão. “O produtor rural precisa estar atento à previsão do tempo e adotar práticas conservacionistas, como terraceamento e cobertura vegetal, para minimizar os impactos das chuvas intensas”, recomendou Vilela.

Produtores rurais
A neutralidade climática em 2025, com a previsão de chuvas acima da média no Brasil Central, desperta preocupações e estratégias diferentes entre produtores rurais de Goiás. Para o produtor rural João Silva, ligado ao Sindicato Rural de Jataí, o desafio principal será lidar com a irregularidade na distribuição das chuvas.

“Quando chove demais em poucos dias, a água não consegue ser bem absorvida pelo solo, e isso aumenta o risco de erosão. Nós, produtores, precisamos intensificar as práticas conservacionistas para proteger nossas lavouras e garantir a produtividade”, afirmou.

Já para Maria de Souza, produtora rural, ligada ao Sindicato Rural de Morrinhos, as expectativas são mais otimistas, mas com ressalvas.

“O aumento do volume de chuvas é bem-vindo, principalmente para a reposição dos nossos mananciais e reservatórios, que sofrem nos períodos secos. Porém, o risco de encharcamento do solo e de pragas nas plantações é algo que preocupa bastante, exigindo planejamento detalhado na escolha das culturas e na aplicação de insumos”, explicou.

Ambos os produtores destacam que, em anos de neutralidade climática, o conhecimento sobre o comportamento do clima local se torna ainda mais essencial.

“Os grandes fenômenos, como El Niño e La Niña, têm seus padrões mais definidos, mas, na neutralidade, a gente precisa prestar atenção em cada sinal do tempo para tomar decisões rápidas. Isso inclui até mudar o calendário de plantio, como já fizemos neste ano”, complementou João.

Maria enfatizou também a importância da assistência técnica e da troca de informações entre os produtores para enfrentar os desafios de 2025.

“A parceria com técnicos agronômicos e meteorologistas será indispensável para nos adaptarmos. A agricultura depende de decisões precisas, e esse cenário irregular exige um trabalho conjunto para minimizar perdas e aproveitar as oportunidades”, disse.

Apesar das dificuldades, os produtores enxergam o período como uma oportunidade para fortalecer a resiliência do setor rural. “A gente está sempre aprendendo com as adversidades. Se conseguirmos planejar bem e investir em tecnologias e práticas sustentáveis, podemos até sair mais fortes de um ano como esse”, concluiu João, reforçando o papel da união e da inovação no campo.

Mananciais e reservatórios: ganhos e preocupações
Um dos pontos positivos do aumento das chuvas é a recarga dos mananciais e reservatórios, essenciais para o abastecimento humano e a geração de energia hidrelétrica. Segundo Amorim, os volumes esperados para janeiro e fevereiro de 2025 devem contribuir significativamente para a recuperação dos níveis de água, que ficaram abaixo do ideal nos últimos anos.

“A previsão é de uma recarga favorável nos principais reservatórios de Goiás, especialmente na bacia do Meia Ponte. Se o volume de chuvas se confirmar, teremos um cenário mais confortável para o período seco de 2025, o que é um alívio em comparação ao ano passado”, destacou Amorim.

Por outro lado, a intensidade das chuvas em curtos períodos pode dificultar a infiltração da água no solo, comprometendo a recarga de aquíferos. Além disso, eventos extremos como enchentes e deslizamentos podem causar prejuízos às cidades e ao setor produtivo.

Preparação e desafios para 2025
Diante do cenário climático projetado, especialistas destacam a importância de ações preventivas para minimizar os impactos das chuvas intensas. Em Goiás, o programa Goiás-Alerta Solidário, relançado recentemente, busca ampliar a capacidade do estado de responder a eventos climáticos extremos.

“É um programa essencial para preparar tanto as cidades quanto as áreas rurais para os desafios climáticos. Ações como a antecipação de alertas, a mobilização de equipes de resposta e a conscientização da população são fundamentais para mitigar os danos causados pelas chuvas”, afirmou André Amorim.

Além disso, municípios goianos precisam investir em infraestrutura de drenagem urbana e em políticas de manejo sustentável dos recursos hídricos. “Sem planejamento, as cidades continuarão sofrendo com enchentes e perdas econômicas. É hora de pensar em soluções de longo prazo, como a ampliação das redes de drenagem e a recuperação de áreas de preservação permanente”, destacou Monteiro.

O ano de 2025, com suas características climáticas específicas, será um teste para a resiliência de Goiás e do Brasil Central. Apesar dos desafios, as perspectivas de chuvas acima da média trazem esperança para a recuperação de mananciais e para o fortalecimento do setor agrícola, desde que medidas adequadas sejam tomadas.

O que são El Niño, La Niña e Neutralidade?
Os fenômenos El Niño, La Niña e a chamada Neutralidade climática estão diretamente ligados ao comportamento das temperaturas do Oceano Pacífico Equatorial e desempenham um papel crucial na regulação do clima global. Abaixo, explicamos cada um deles:

El Niño
O El Niño é caracterizado pelo aquecimento anormal das águas superficiais do Oceano Pacífico Equatorial, que pode influenciar diretamente os padrões de chuva e temperatura ao redor do mundo. No Brasil, os efeitos do El Niño geralmente incluem:

  • Chuvas acima da média na Região Sul, aumentando o risco de enchentes e deslizamentos.
  • Secas prolongadas na Região Nordeste e em partes da Região Norte.
  • Irregularidades no regime de chuvas no Brasil Central, afetando a agricultura.

Esse fenômeno ocorre com intervalos de dois a sete anos e pode durar de nove meses a dois anos. Sua intensidade varia de moderada a forte, dependendo do grau de aquecimento das águas.

La Niña
Em contraste, a La Niña é o fenômeno oposto, marcado pelo resfriamento das águas do Pacífico Equatorial. No Brasil, a La Niña geralmente resulta em:

  • Chuvas acima da média na Região Norte e Nordeste, o que pode beneficiar os reservatórios, mas também aumentar os riscos de enchentes.
  • Redução das chuvas na Região Sul, ampliando o risco de estiagens severas.
  • Clima mais estável, com períodos de seca e chuva equilibrados no Brasil Central.

Assim como o El Niño, a La Niña também apresenta variações de intensidade e pode durar de um a dois anos, dependendo das condições oceânicas.

Neutralidade
A Neutralidade climática, por sua vez, ocorre quando as temperaturas do Pacífico Equatorial permanecem dentro da média histórica, sem grandes aquecimentos ou resfriamentos. Apesar de parecer um estado de estabilidade, a Neutralidade pode apresentar desafios próprios, pois o clima fica mais dependente de fatores regionais e de outros oceanos, como o Atlântico.

No caso de 2025, como apontado por André Amorim, a Neutralidade deve prevalecer, mas com influência do Oceano Atlântico aquecido. Isso pode gerar chuvas acima da média no Brasil Central, mas de maneira irregular, intensificando eventos extremos como enchentes em áreas urbanas e secas em locais produtivos.

Esses fenômenos são monitorados por instituições globais, como a Organização Meteorológica Mundial (OMM), e por centros de pesquisa nacionais, como o Cimehgo, sendo fundamentais para o planejamento climático e agrícola.